segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

25 de fevereiro 2003/2013



- Filha, quando tudo estiver muito negro, quando o peso nas costas parecer insuportável, quando não conseguires respirar este mundo poluído, sobe a uma montanha.
- Porquê, Pai?
- Verás que o ar é mais leve, as pessoas ficam pequeninas, insignificantes, e os problemas também. Respira fundo, enche os pulmões de Natureza.

Muitas dezenas de anos depois:
- Obrigada, Pai. Não leste T. S. Eliot, mas ajudaste-me a gostar dele.
Dá-me a mão e vem comigo até ao Marão de Pascoaes. Vamos comer uma feijoada e beber um maduro tinto. Conta-me a tua história de amor. Ensina o segredo para as tuas últimas palavras:
- Como está a Mãe? Trata dela. – disseste há dez anos atrás. Fechaste os olhos, cansado. A mão entrelaçada na minha. Assim permanecemos juntos, de mãos dadas, até ao fim.
Agora vou até à montanha.

domingo, 10 de fevereiro de 2013

procura-se

 
Wolf Ademeit
 
 
procura-se um intervalo
possível entre o silêncio e as palavras
um rumor de água
uma película de luz
que aconchegue as feridas
de cada vez que faz domingo chuvoso.
 
nas circunvoluções cerebrais haverá com
(in)certeza uma medida para
celebrar a poesia.


sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

assim, disse ela

 Edward Hopper
 
 
apareça um dia ao fim da tarde.

beberemos uma tisana na esquadria da janela e tocaremos a quatro mãos a polpa dos pêssegos.
venha conhecer o meu horizonte. depois
(se quiser)
 
parta com as gaivotas. a mim, basta-me mergulhar nos seus olhos.
e morrer.
 


domingo, 3 de fevereiro de 2013

cantiga


ay, meu mar salgado,
quanto do teu sal
resgatou as palavras do meu dicionário!
as ondas do verde pinho
espraiam-se pelas páginas
outrora alvas e nós meninas
bailamos y!
o vento lavou lençóis
os cervos saltaram pinhais
e um suspiro bastou
para regar de sangue
os barcos dos poetas.
pela brisa da madrugada
pergunto novas de meu amigo
ay, mar y u é?

 
é tanta a literatura que te escorre pelas veias
lá na Praia da Boa Nova lazúli
que eu sem ti não vivo
em ti me morro.