terça-feira, 14 de janeiro de 2014

morte cardíaca


não sei se foi um tiro à queima roupa
ou a queda num poço distraído
se foi uma degenerescência lenta
ou apenas uma pétala que caíu

sei que o coração já não me bate
e o gelo se espalhou pelas veias.

adeus.

domingo, 17 de novembro de 2013

ao invés



apenas uma questão de língua e do ângulo dos raios solares sobre a mão que te afaga os seios enrugada amarelecida do tabaco cansada dos sonhos perdidos num qualquer rochedo.
apenas uma questão de horário do comboio que me leva para norte onde a aridez das casas serpenteia entre as guedelhas esbranquiçadas que me cobrem os olhos.
apenas uma questão de teclas empanadas do piano que abandonei ao fogo em desespero de fuga maior.
apenas uma questão de odor de livros húmidos sangrando palavras inúteis nas celas beneditinas.
apenas amantes ou nem sequer
apenas talvez para depois
fique sem efeito
foi um engano
apenas

domingo, 3 de novembro de 2013

lágrimas









implosão da frase
no meu coração:
ninguém vê os estilhaços
cravados nas veias
disfarço os soluços
em tatuagens
sobre os olhos
e a raiva afoga-se
nas esquinas do pó
engulo as facas de
dois gumes
disparo às cegas
sobre os meus pés
e rasgo o dorso
do amor
num caderno
de mercearia a cheirar
a bolor
quando faço silêncio
é porque seria
incredível
mostrar as chagas dos
sonhos que carrego
nos bolsos
descalço
caminho sobre o vulcão
barba grisalha
de esperar a lâmina
que há-de conjugá-la
sobre o poema
ao fim do terceiro dia.

terça-feira, 29 de outubro de 2013

nova grafia



não é a pena
de Perdigão
nem a dor
de Pessoa
autopsicográfica:
é a mágoa
deste país decepado
que empena
as calhas
do coração.

domingo, 13 de outubro de 2013

kairos




em cima da mesa
o café e o tabaco
memórias distantes
de mnahãs assim chuvosas
num quartier-latin
com cheiro a patchouli
de mistura com a brasileira
e uma janela sobre o mar
postais da provença
notícias do festival d'avignon
o siroco lá fora a
aconchegar o corpo jovem
sedento de amor
agora
este tecido desfaz-se
sob a caneta com
décadas de histórias
desabituada de epístolas
pueris dos postais de férias
das cartas da guerraesquecida

ela pede-me silêncio.
ela pede-me música.
ela pede-me solidão.

em cima da mesa
isolo-me do ruído
com headphones dos chineses
e parto à procura
de um sinal apenas
de um suspiro ou odor
de uma silhueta
que encaixe no meu colo
de um diálogo feito
só de olhos e gestos
que derrube as caderias
que alerte os costumes
que escandalize os jornais
na linha das tuas costas
desenharei
um grito a bâton
de amor
qie consiga sobrepôr-se
à comodidade dos sim.

vem comigo
fugir de kronos.

sábado, 12 de outubro de 2013

imperativamente

 
J.H. Lartigue
 
não te sentes assim
despudorada
de braços abertos ao destino:
posso tropeçar-te
nas pernas
e desviar-te do rumo
aprumado.

domingo, 6 de outubro de 2013

pas de deux

 
 
prefiro acordar
na tua língua
sobre o mar
na pele de cetim
adamascado
no silêncio
que nos cobre
o desejo.
 
prefiro acordar
em pas de deux
a não acordar.